As Bandas de Pífano foram reconhecidas, nesta sexta-feira (26), como Patrimônio Imaterial Cultural de Pernambuco. A decisão do Conselho Estadual de Preservação do Patrimônio Cultural (CEPPC/PE) foi tomada durante reunião ordinária do Conselho realizada em Caruaru, cidade onde se encontra grande parte das bandas de pífano no agreste pernambucano. A resolução com a decisão agora segue para publicação no Diário Oficial do Estado e homologação do governador. Em seguida, o bem cultural será inscrito no Livro de Registro do Patrimônio Cultural Imaterial do Estado de Pernambuco. Este é o segundo registro em âmbito estadual totalmente tramitado sob o fluxo da Lei Estadual de Registro de Bens Imateriais, que também registrou recentemente a festa de São Lourenço do Mártir como Patrimônio Imaterial Cultural do Estado. “O reconhecimento das bandas de pífanos faz parte da política do Governo do Estado de Pernambuco, regulamentada pela Lei estadual nº 16.426/2018, que institui o Sistema Estadual de Registro e Salvaguarda do Patrimônio Cultural Imaterial, no âmbito do Estado de Pernambuco, em 2018, tem o objetivo de proteger e preservar nossos bens culturais por meio do Sistema Estadual de Registro e Salvaguarda do Patrimônio Cultural Imaterial”, destaca Oscar Barreto, secretário Estadual de Cultura e presidente do CEPPC/PE. A legislação é bastante parecida com a estabelecida por meio do Iphan, a nível federal – onde também corre um processo de registro das bandas de pífano, desta vez como Patrimônio Imaterial do Brasil. ![]() A instrução do processo contou com a colaboração do projeto “Pífanos de Pernambuco – Do Mapeamento à Salvaguarda” (www.tocandopifanos.com), produzido com recursos do Funcultura e premiado, em 2022, com o primeiro lugar na categoria Promoção e Difusão do Prêmio Ayrton de Almeida Carvalho de Preservação do Patrimônio Cultural “Embora esteja em andamento o processo de registro das Bandas de Pífano em âmbito nacional, partimos primeiro no reconhecimento da manifestação artística em âmbito estadual. Isso demonstra o compromisso do CEPPC/PE com a salvaguarda do Patrimônio Imaterial. Destaco que, neste ano, o Conselho de Preservação elegeu como Patrimônio Vivo a Banda de Pífano Folclore Verde de Castainho, de Garanhuns. Permanecemos com o compromisso junto ao governo e a sociedade civil em prol do patrimônio cultural pernambucano”, ressalta Cássio Raniere, vice-presidente do CEPPC/PE. HISTÓRICO - O pedido de Registros das Bandas de Pífano de Pernambuco foi iniciado em 2019, por José Amaro Filho, Claudia Moraes Lisboa e Eduardo Monteiro, representantes de uma comissão formada por pesquisadores, produtores, músicos e apoiadores das Bandas de Pífano. Além da documentação, que mapeou 82 bandas de pífanos, especialmente no Agreste e Sertão de Pernambuco, foram realizados encontros virtuais com detentores para explicar sobre o processo e sistematizar informações de base para as diretrizes de salvaguarda das Bandas de Pífano no Estado. A instrução do processo contou com a colaboração do projeto “Pífanos de Pernambuco – Do Mapeamento à Salvaguarda” (www.tocandopifanos.com), produzido com recursos do Funcultura e premiado, em 2022, com o primeiro lugar na categoria Promoção e Difusão do Prêmio Ayrton de Almeida Carvalho de Preservação do Patrimônio Cultural. A análise técnica preliminar e a elaboração do inventário que fundamentou a decisão foram realizadas e entregues ao CEPPC/PE pela Secretaria Estadual de Cultura (Secult-PE) e Fundação do Patrimônio Histórico e Artístico de Pernambuco (Fundarpe) no ano passado. ![]() A Secult-PE/Fundarpe e o CEPPC realizaram encontros virtuais com detentores para explicar sobre o processo e sistematizar informações de base para as diretrizes de salvaguarda das Bandas de Pífano no Estado Foram responsáveis pela relatoria do processo de registro as conselheiras Mônica Siqueira, representante do segmento de Expressões Culturais de Pernambuco registradas como Patrimônio Cultural Imaterial; e Cláudia Pinto, suplente do segmento de Arquitetura, Urbanismo, Geografia e Engenharia. O registro das Bandas de Pífano resultou também no livro Pífanos do Sertão, produzido pela Página 21 com recursos do Funcultura. Em 144 páginas, Pífanos do Sertão revela aspectos sociais, econômicos e culturais que envolvem as bandas de pífanos sertanejas, detalhando a importância da religiosidade em suas funções e as peculiaridades sonoras de cada uma. Amplamente ilustrada, a obra traz ainda um apêndice com partituras de benditos, marchas e baiões de grande difusão entre os grupos sertanejos. O livro teve organização de Rafael Coelho, textos de Eduardo Monteiro, artigos de Amaro Filho, Caca Malaquias e José Cláudio Lino, fotos de Claudia Moraes, transcrição de partituras por Caca Malaquias e diagramação de Vladimir Barros. ![]() Análise técnica preliminar e elaboração do inventário que fundamentou a decisão foram realizadas e entregues ao CEPPC/PE pela Secult-PE/Fundarpe no ano passado Sobre as Bandas de Pífano – Os grupos têm suas origens remotas nos grupos musicais que aportaram na América Portuguesa e Espanhola durante os diferentes ciclos de povoamento a partir do século XVI. O formato recria os conjuntos de flautas e bombos que acompanhavam festas, procissões, celebrações litúrgicas ou profanas e também grupamentos militares. O pífano, ou pife, pela sua produção artesanal e fácil transporte, logo passou a ser utilizado por diferentes perfis de músicos e também para facilitação de processos de catequese de povos indígena. Instrumentos de sopro semelhantes a esse já eram conhecidos e mesmo utilizados por povos originários brasileiros antes mesmo do processo de colonização e aculturação. Outros instrumentos fazem parte da banda de pífanos: zabumba, contra surdo, tarol e o conjunto de pratos compõem o conjunto, e toda a lógica de produção artesanal dos instrumentos de percussão também faz parte do conjunto de saberes que orbitam este bem cultural. A formação apontada como tradicional é de quarteto, sendo dois pifeiros, um principal e outro secundário, um zabumbeiro e um tocador de caixa. É comum também encontrar a variação que inclui o contra surdo e os pratos formando o sexteto, sendo esta a forma mais encontrada especialmente em grupos formalizados. Grande parte das bandas possuem nomes ligados à localidade onde estão inseridas, aos seus formadores ou aos santos de devoção da comunidade. As vestimentas semelhantes às vestes de cangaceiros começaram a ser adotadas por volta da década de 1960 por influência da Banda de Pífano de Caruaru, em cuja justificativa figura o relato do seu líder Sebastião Biano, de ter tocado para o bando de Lampião. É comum também encontrar paramentos mais discretos com calças e camisas padronizadas, por vezes lisas ou xadrez, além de chapéus de couro e quepes no figurino. Publicado originalmente em http://www.cultura.pe.gov.br/canal/servico/bandas-de-pifano-de-pernambuco-sao-registradas-como-patrimonio-cultural-imaterial-de-pernambuco-2/ |

sábado, 27 de agosto de 2022
domingo, 10 de julho de 2022
A "Pedra do Tendó" e sua origem
O Cangaceiro Tendó
Por Alexsandro Acioly
Quem parte de
Afogados da Ingazeira, sentido a cidade de Patos no sertão paraibano, encontra um
dos pontos mais bonitos da viagem: a pedra
do tendó,. A mesma fica localizada na serra do Teixeira, onde se tem uma
visão espetacular que se estende até a divisa entre os estados da Paraíba e do
Rio Grande Norte.
Imagem aérea da Pedra do Tendó (imagem/internet)
Reza a lenda
que o nome da pedra se deve ao fato de que uma vítima, após uma briga com um
inimigo, despencou da pedra e ao cair do penhasco gritou “tem dó”. O tal grito
ecoou até os moradores da localidade como pedido de socorro, assim nomeando a pedra.
Visão da Pedra: a baixo a cidade de São José do Bonfim (imagem/internet)
Em conversa com o amigo, e confrade, Lindoaldo (mestre em História dos Sertões) o mesmo enviou um material importante para a denominação do local. Trata-se de um texto do escritor Pedro Baptista, presente em um livro do Instituto Histórico e Geográfico Paraibano.
Segundo o escritor, entre os séculos XVIII e XIX, alguns cangaceiros já povoavam a região do Teixeira, que fica localizada na divisa entre os estados de Pernambuco e da Paraíba. Dentre eles, podemos citar Cazuza Barreto, Antônio Tomaz de Carvalho, Liberato, João do Bonfim e Adolfo Roza Meia-Noite.
Um dos primeiros a habitar a região de Teixeira foi o “Tendó”. Vindo da região de Goiana, em Pernambuco. Após cometer um crime ele se esconde na região e procura o donatário João Leitão que, junto a Lopes Romeu, foi um dos primeiros moradores daquelas terras. Se fala muito da bravura do Tendó; talvez pela localização estratégica, e pelo fato do crime em Pernambuco, tenha-se a ilusão de sua valentia.
Não se tem certeza sobre qual seria a verdadeira história sobre a Pedra do Tendó. Na dúvida, ficamos com as duas: a do grito e a do cangaceiro.
sexta-feira, 8 de julho de 2022
Ouro Velho terá primeira mostra de cinema
O Festcimm – Festival de Cinema no Meio do Mundo-, realizará a primeira Mostra de Cinema de Ouro Velho.
Esta implantação de mais uma janela audiovisual no estado, desta vez no cariri paraibano faz parte do projeto de socialização de saberes e técnicas do Festicimm, que este ano já realizou edições em todas as regiões da Paraíba.
A Mostra de Cinema de Ouro Velho é uma realização do Festival, com apoio da Prefeitura Municipal de Ouro Velho, e produção do Coletivo Gambiarra e do produtor Flávio Freitas.
A mostra homenageará a atriz paraibana Mayara Neiva que, saída das passarelas e palcos no início da década de 2000 tem cada vez mais se destacado no cinema e na TV.
A Mostra de Cinema de Ouro Velho tem início nesta sexta (08) e vai até o domingo(10) com mostras de curtas e de animação, além da mostra Foco com filmes paraibanos e duas oficinas audiovisuais: Do jogo à cena (Cely Farias-PB) e Edição de vídeos – Da Vinci Resolve (Lucas Marinho-PE). Confira a programação completa em clicando aqui. As informações são do Cariri em Ação.
domingo, 3 de julho de 2022
Poema em linha reta - Fernando Pessoa
O belo Poema em linha reta foi escrito por Fernando Pessoa (foto) e assinado como Álvaro de Campos. Segundo a Mestra Carolina Marcello entre 1914 e 1935, sem que haja precisão da data.
Diz ela, o poema é uma crítica às relações sociais que Campos parece observar, de fora, e a sua incapacidade de se operar pelas regras de etiqueta e conduta vigentes. O sujeito lírico aponta a falsidade e hipocrisia dessas relações.
Vale a pena ler e assistir uma interpretação arretada do ator Osmar Prado, em cena da novela O Clone, de 2002.
Poema em linha reta
Nunca conheci quem tivesse levado porrada.
Todos os meus conhecidos têm sido campeões em tudo.E eu, tantas vezes reles, tantas vezes porco, tantas vezes vil,
Eu tantas vezes irrespondivelmente parasita,
Indesculpavelmente sujo,
Eu, que tantas vezes não tenho tido paciência para tomar banho,
Eu, que tantas vezes tenho sido ridículo, absurdo,
Que tenho enrolado os pés publicamente nos tapetes das etiquetas,
Que tenho sido grotesco, mesquinho, submisso e arrogante,
Que tenho sofrido enxovalhos e calado,
Que quando não tenho calado, tenho sido mais ridículo ainda;
Eu, que tenho sido cômico às criadas de hotel,
Eu, que tenho sentido o piscar de olhos dos moços de fretes,
Eu, que tenho feito vergonhas financeiras, pedido emprestado sem pagar,
Eu, que, quando a hora do soco surgiu, me tenho agachado
Para fora da possibilidade do soco;
Eu, que tenho sofrido a angústia das pequenas coisas ridículas,
Eu verifico que não tenho par nisto tudo neste mundo.Toda a gente que eu conheço e que fala comigo
Nunca teve um ato ridículo, nunca sofreu enxovalho,
Nunca foi senão príncipe - todos eles príncipes - na vida...Quem me dera ouvir de alguém a voz humana
Que confessasse não um pecado, mas uma infâmia;
Que contasse, não uma violência, mas uma covardia!
Não, são todos o Ideal, se os oiço e me falam.
Quem há neste largo mundo que me confesse que uma vez foi vil?
Ó príncipes, meus irmãos,Arre, estou farto de semideuses!
Onde é que há gente no mundo?Então sou só eu que é vil e errôneo nesta terra?
Poderão as mulheres não os terem amado,
Podem ter sido traídos - mas ridículos nunca!
E eu, que tenho sido ridículo sem ter sido traído,
Como posso eu falar com os meus superiores sem titubear?
Eu, que venho sido vil, literalmente vil,
Vil no sentido mesquinho e infame da vileza.
domingo, 26 de junho de 2022
Gilberto Gil 80 anos: 10 músicas para celebrar um dos maiores artistas do Brasil
Do Diário do Nordeste
É dia de Gilberto Gil. Neste domingo (26), um dos maiores cantores e compositores brasileiros de todos os tempos completa 80 anos. Nascido em Salvador no ano de 1942, Gil é a síntese inspirada de um país diverso, pulsante e crítico. É também motor: a cada novo projeto – e até mesmo na convivência com familiares, compartilhada aos montes nas redes sociais – o ícone promove novas formas de abraçar a arte, a cultura e a vida.
A carreira iniciou no acordeon, nos anos 1950. Inspirado por Luiz Gonzaga (1912-1989), pelo som do rádio e pelas procissões na porta de casa, logo tratou de explorar a sonoridade sertaneja. Até que surge João Gilberto (1931-2019), a Bossa Nova, e também Dorival Caymmi (1914-2008), com canções praieiras e o mundo litorâneo. Influenciado, Gil deixou de lado o acordeon e empunhou o violão. Em seguida, a guitarra elétrica – instrumentos que abrigam as harmonias particulares da obra desse gênio até hoje.
A tônica das criações de Gilberto é retratar a nação. Um dos pontos altos dessa dinâmica foi a Tropicália ou Movimento Tropicalista, iniciado por ele juntamente a Caetano Veloso em 1963, na Universidade da Bahia. O projeto buscava contemplar e internacionalizar a música, o cinema, as artes plásticas e toda a arte brasileira. Gal Costa, Tom Zé, Rogério Duprat, José Capinam, Torquato Neto, Rogério Duarte, Nara Leão, entre outros, uniram-se à dupla munidos do mesmo fim.
O movimento, contudo, gerou descontentamento da ditadura vigente, devido aos gestos e criações libertárias. Resultado: exílio. Em Londres, Gil toma como maior influência os Beatles, Jimmi Hendrix e todo o mundo pop que despontava na época. De volta ao Brasil, o volumoso legado desse contato não se extingue. Pelo contrário, impulsiona maneiras de dialogar com aspectos ainda mais ricos da arte.
De lá para cá, o mestre foi Ministro da Cultura no Governo Lula; eleito Artista da Paz pela Unesco (Organização das Nações Unidas para a Educação, a Ciência e a Cultura); Doutor Honoris Causa pela Universidade de Berklee; e, mais recentemente, imortal pela Academia Brasileira de Letras (ABL), ocupante da cadeira de número 20. Exemplo e bravura por entre diversos reconhecimentos, mais de 60 discos e uma trajetória desconhecedora de limites.
Neste momento, Gil celebra a nova primavera na Europa. Ele inicia hoje a turnê do show "Nós, a gente", com os filhos e netos. Além disso, a Companhia das Letras lança a terceira edição de "Gilberto Gil - Todas as Letras", com a totalidade das canções do compositor, uma cronologia e centenas de comentários – diversos deles inéditos – do autor a respeito das letras.
Nesse clima de festa e reverência, o Verso selecionou dez músicas que traduzem o espírito multifacetado de Gil, o xamã incontornável de nosso chão.
"Drão"
A lista abre com um dos maiores sucessos do gênio. "Drão" está presente no disco "Um Banda Um" (1982) e retrata uma confissão, busca por perdão dos erros cometidos e reflexão do então relacionamento que o cantor e compositor havia terminado. Gil foi casado durante 17 anos com Sandra Gadelha, com ela teve três filhos, Pedro, Preta e Maria.
"A Paz"
Belíssima, a canção foi escrita sob a inspiração da obra de Liev Nikoláievich Tolstói (1828-1910), intitulada "Guerra e Paz". A situação concreta para a composição foi a de que o cantor e compositor João Donato certo dia fora na casa de Gilberto Gil com várias canções, todas elas chamadas "Leila". Era no total de quinze ou dezesseis. João Donato entregou-as para Gil e cochilou. Foi a imagem dele cochilando sossegado à luz do dia e a lembrança do livro de Tolstói que constituíram o marco inspirador para a música.
"Andar com fé"
No aniversário de 78 anos, em 2020 – durante um dos momentos mais nebulosos da pandemia de Covid-19 – Gil presenteou o Brasil e o mundo com uma nova versão desta celebrada composição. A história da canção é contada no disco “Todas as letras”, de Gilberto Gil, e organizado por Carlos Rennó (Companhia das letras, 1996). O grande mote da música é a utilização da expressão “faiá” no lugar da linguisticamente correta, “falhar”. Segundo o criador, “Faiá é coração, falhar é cabeça, e fé é coração”.
"Tempo Rei"
Lançada no disco "Raça humana" (1984), outra canção de esperança do mestre. "Tempo Rei" reafirma a veia filosófica-otimista do cancioneiro de Gilberto Gil. A fé no futuro – ou em algo para além do alcance da razão –, porque consciente das transformações do presente, é a base temática, além da vulnerabilidade das coisas e das fragilidades dos laços humanos.
"Palco"
Gravada pela primeira vez pela banda "A Cor do Som (1977)", "Palco" foi registrada no álbum “Luar (A Gente Precisa Ver o Luar)”, de 1981. Segundo o próprio Gil, esta é "uma canção que era na verdade pra não deixar dúvida a respeito de tudo o que cantar representa para mim, e a respeito da minha relação com a música – simbolizada de forma completa pelo estar no palco". Linda!
"Se eu quiser falar com Deus"
No início de 1980, Roberto Carlos pediu para Gilberto Gil criar uma
música para ele lançar com exclusividade, mas não detalhou a temática
que desejava para aquela faixa. O artista baiano pensou e supôs que o amigo iria querer falar de algo religioso. Assim nasceu a tocante "Se eu quiser falar com Deus", também presente no disco "Luar (A Gente Precisa Ver o Luar)", de 1981.
"Aquele abraço"
Gil, ao ser libertado do quartel no Realengo, no qual passou sessenta dias preso, retornou em uma quarta-feira de Cinzas ao povo e à convivência no Rio de Janeiro. Nesse clima de volta, ele foi deixando o próprio “abraço” de maneira especial ou irônica a todos aqueles que marcaram sua existência.
"Vamos fugir"
O cantor estava viajando pela Jamaica em 1984 junto ao produtor Liminha para gravar com a banda “The Wailers” (lendária banda de Bob Marley). Um dia, Liminha acordou, pegou uma guitarra desligada, sentou no chão e começou a compor a estrutura da letra em inglês – a princípio, com base na frase “Gimme your love”. "Vamos Fugir” marcou a carreira de Gil ao traduzir o ritmo reggae no Brasil, naquela época ainda pouco explorado.
"Toda menina baiana"
'Feita em Salvador ao lado de Nara, filha mais velha de Gil, enquanto ela estava na pré- adolescência, "Toda menina baiana" é para ela e por causa dela. Fala do caráter fundador da Bahia e das virtudes e defeitos do homem. "Por força da busca de compreensão do divino no humano, eu me empenhava em me desvencilhar do maniqueísmo, abarcando as ideias ligadas tanto ao bem quanto ao mal. De lá pra cá, esse ficou sendo um tema básico de minhas canções".
"Não Chore Mais"
Forte e melancólica, "Não Chore Mais" – coincidindo com o momento em que a abertura política estava começando no Brasil – acabou por se referir a todo um período de repressão no país. Conforme o próprio Gil, “eu pensava na transposição de uma cena jamaicana para uma cena brasileira a mais similar possível nos aspectos físico, urbano e cultural. 'No Woman, No Cry' retratava o convívio diário de rastafaris no ‘government yard' em Trenchtown, e a perseguição policial que eles sofriam. Esta situação eu quis transportar para o parque do Aterro (RJ), também um parque público, onde localizei policiais em vigília e hippies em rodinhas, tocando violão e puxando fumo".
Transcrito de: https://diariodonordeste.verdesmares.com.br/verso/gilberto-gil-80-anos-10-musicas-para-celebrar-um-dos-maiores-artistas-do-brasil-1.3248603
quinta-feira, 16 de junho de 2022
95 anos de Ariano Suassuna: ressentimento por João Pessoa inspirou obra do paraibano
![]() |
Ariano Vilar Suassuna nasceu em 16 de junho de 1927 na Parahyba do Norte, capital da Paraíba. Foto: divulgação |
Por José Nunes* / Jornal da Paraíba
Ariano Vilar Suassuna nasceu em 16
de junho de 1927 na Parahyba do Norte, capital da Paraíba que mais tarde
passaria a se chamar ‘João Pessoa’. Nome que o poeta paraibano se recusava a
verbalizar por carregar o sangue e a dor que a família carrega até hoje.
Mesmo marcado pelo ressentimento,
os fatos e acontecimentos que marcaram o ano de 1930 na Paraíba, notadamente a
vida de seu pai, João Suassuna, de familiares e de aliados políticos, associado
às raízes culturais do Sertão, são as bases da obra literária de Ariano
Suassuna, composta de romances, poemas, peças de teatro, pinturas, iluminuras e
desenhos.
Os acontecimentos políticos de
1930 na Paraíba, que culminaram em assassinatos e perseguições, mais de noventa
anos depois continuam a repercutir e a exigir aprofundados estudos e análises
documental para esclarecimentos à História.
Como ele costumava dizer que
passou toda a sua vida buscando decifrar as razões que levaram ao assassinato
de seu pai, “de forma traiçoeira numa emboscada”. Escrever sobre aqueles
acontecimentos era, no seu entender, manter viva a memória daquele que foi o
seu rei e seu herói. Revelou, certa vez, que em mais de uma oportunidade tentou
escrever a história do pai, mas era dominado pela emoção.
Sua obra máxima, “Romance d’A
Pedra do Reino e o príncipe do sangue do vai-e-volta, que passou mais de duas
décadas elaborando, está a presença do pai, como um Dom Sebastião I, rei de
Portugal que, em 1578, desapareceu em uma batalha para nunca mais voltar, mesmo
que no imaginário voltaria um dia.
Nesse sentido, João Suassuna
assume papel preponderante na obra de Ariano, uma obra que pretende ser um
protesto contra tudo o que fizeram com sua família e os correligionários de seu
pai e, 92 anos depois dos acontecimentos, continua a repercutir.
Agora, com se faz memória de Ariano Suassuna por ocasião do seu
nascimento, rever os caminhos da história é manter presente o desejo dele para
que os caminhos percorridos pelo seu pai, nas terras por ele consideradas
luminosas, continuem sendo habitados.
Uma história recheada de episódios de sangue, de traição às
amizades e constantes desavenças que perduram porque passaram da civilidade
para a brutalidade, do ódio ao rancor na imposição da vontade imperativa e da
ganância pelos louros do poder.
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Vida e obra de Ariano Suassuna também inspirou artista plástico Flávio Tavares. Foto: reprodução |
Aqui morava um rei (Ariano Suassuna)
Aqui morava um rei quando eu menino
Vestia ouro e castanho no gibão,
Pedra da Sorte sobre meu Destino,
Pulsava junto ao meu, seu coração.
Para mim, o seu cantar era Divino,
Quando ao som da viola e do bordão,
Cantava com voz rouca, o Desatino,
O Sangue, o riso e as mortes do Sertão.
Mas mataram meu pai. Desde esse dia
Eu me vi, como cego sem meu guia
Que se foi para o Sol, transfigurado.
Sua efígie me queima. Eu sou a presa.
Ele, a brasa que impele ao Fogo acesa
Espada de Ouro em pasto ensanguentado.
Se no decorrer da nova forma e
sistema de governo que no País foram implantados, quando foi destituída a
Monarquia em novembro de 1889, a partir do golpe militar comandado pela
Marechal Deodoro da Fonseca, com apoio de proprietários de terras, senhores dos
cafezais, da pecuária e da cana de açúcar, insatisfeitos com a perda da força
do trabalho escravo, daí, novas formas de dominação surgiram nos Estados.
Na Paraíba, sem dúvida, começaram a aparecer as personalidades que
criaram vínculos com o poder republicano para, a todo o custo, continuar
usurpar no comando político. O surgimento lideranças, com raízes nas mesmas
linhagens escravocratas ou procedentes da brutalidade de terras ressequidas dos
sertões, não demorou desgradearam-se. Agarrando-se a picuinhas pessoais até
chegar o distanciamento e, assim, consolidar o poder pessoal.
Entre as famílias da Paraíba que mais se envolveram em intrigas,
que passaram das paisagens política para a pessoal, foram os Pessoas, os Dantas
e os Suassunas, em maior dimensão. Mesmo que em diferentes regiões do Estado,
desde o Brejo ao Sertão, os coronéis tomavam posições em favor de suas
ideologias que perseguiam para se manter no poder.
Foi João Suassuna, entre as personagens da política de 1930, na
Paraíba, quem mais sofreu, tendo em vista que João Dantas, por ser primo de sua
esposa Rita de Cássia, as rixas políticas patrocinadas pelos Pessoas recaíram
sobre sua família. Neles respingaram os ranços do ódio e da impiedosa perseguição
política e pessoal, até chegar aos assassinatos.
Assassinato de João Suassuna, no dia 9 de outubro de 1930, no Rio
de Janeiro, quando tentava esclarecer à Nação sua inocência e defender-se das
acusações imputadas pelos adversários políticos e a essa altura inimigos
ferrenhos, a partir de discurso na Câmara Federal, onde ocupava uma cadeira de
deputado, não pôs fim as perseguições à sua família e seus amigos, sobretudo
aos que se opunham ao comando do presidente (governador) João Pessoa.
Decorrido muitos anos, José Américo de Almeida, que foi um dos
principais articulador da campanha de 1930 e das investidas contra os coronéis
opositores do governo, homem próximo a João Pessoa, Secretário das Forças
Públicas, reconheceria que Suassuna era um inocente que perdeu a vida. “Vítima
inocente, no mais monstruoso dos atentados”, escreveu José Américo.
Se no decorrer da nova forma e
sistema de governo que no País foram implantados, quando foi destituída a
Monarquia em novembro de 1889, a partir do golpe militar comandado pela
Marechal Deodoro da Fonseca, com apoio de proprietários de terras, senhores dos
cafezais, da pecuária e da cana de açúcar, insatisfeitos com a perda da força
do trabalho escravo, daí, novas formas de dominação surgiram nos Estados.
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Ariano Suassuna transformou a dor pela perda do pai em vasta obra. Foto: Leo Martins/Agência O Globo |
Na Paraíba, sem dúvida, começaram a aparecer as personalidades que
criaram vínculos com o poder republicano para, a todo o custo, continuar
usurpar no comando político. O surgimento lideranças, com raízes nas mesmas
linhagens escravocratas ou procedentes da brutalidade de terras ressequidas dos
sertões, não demorou desgradearam-se. Agarrando-se a picuinhas pessoais até
chegar o distanciamento e, assim, consolidar o poder pessoal.
Entre as famílias da Paraíba que mais se envolveram em intrigas,
que passaram das paisagens política para a pessoal, foram os Pessoas, os Dantas
e os Suassunas, em maior dimensão. Mesmo que em diferentes regiões do Estado,
desde o Brejo ao Sertão, os coronéis tomavam posições em favor de suas
ideologias que perseguiam para se manter no poder.
Foi João Suassuna, entre as personagens da política de 1930, na
Paraíba, quem mais sofreu, tendo em vista que João Dantas, por ser primo de sua
esposa Rita de Cássia, as rixas políticas patrocinadas pelos Pessoas recaíram
sobre sua família. Neles respingaram os ranços do ódio e da impiedosa
perseguição política e pessoal, até chegar aos assassinatos.
Assassinato de João Suassuna, no dia 9 de outubro de 1930, no Rio
de Janeiro, quando tentava esclarecer à Nação sua inocência e defender-se das
acusações imputadas pelos adversários políticos e a essa altura inimigos
ferrenhos, a partir de discurso na Câmara Federal, onde ocupava uma cadeira de
deputado, não pôs fim as perseguições à sua família e seus amigos, sobretudo
aos que se opunham ao comando do presidente (governador) João Pessoa.
Decorrido muitos anos, José Américo de Almeida, que foi um dos
principais articulador da campanha de 1930 e das investidas contra os coronéis
opositores do governo, homem próximo a João Pessoa, Secretário das Forças
Públicas, reconheceria que Suassuna era um inocente que perdeu a vida. “Vítima
inocente, no mais monstruoso dos atentados”, escreveu José Américo.
Durante muito tempo, como que
planejado, a morte de João Suassuna passou quase que despercebida nos
compêndios e abordagens sobre a revolução de 1930, quando se dava mais destaque
a João Pessoa e João Dantas. Mas a morte de João Suassuna abalou e fez calar o
Sertão, emudeceu o Brejo e no Litoral o choro pela perda se espalhou. Mas esse
grito de dor, abafado no primeiro momento, mesmo que lentamente está chegando
na recomposição da história.
Quando foi assassinado, João Suassuna carregava no bolso a
histórica e esclarecedora carta endereçada à esposa, na qual declarava sua
inocência, temia ser morto e recomendava afastar-se do cenário de intrigas em
que se transformou a Paraíba, como forma de proteger a família.
Inicialmente, recolhida à fazenda Acahuan, à época localizada no
município de Sousa – hoje em Aparecida -, dona Rita Suassuna persistia em busca
de esclarecer os fatos em memória do marido assassinado e esquecido, enquanto
que os “vitoriosos” empurravam ao esquecimento e ao sofrimento antigos aliados.
Com os filhos menores, dona Rita Suassuna não ficou acuada, mas
manteve-se firme na defesa da família e da honra do marido. Seguia fielmente as
recomendações deixada pelo marido na carta de despedida, de que não buscassem
vingança, mas justiça e o esclarecimento dos fatos.
Durante toda a sua vida ela, que faleceu aos 94 anos em abril de
1990, manteve-se com serenidade quanto aos fatos, levando os filhos a
permanecerem confiantes de que, um dia, tudo estaria esclarecido e a justiça à
memória de João Suassuna perante a história, aconteceria.
Percebe-se pelos depoimentos e pelo comportamento dos familiares
de João Suassuna, desde os primeiros momentos de quando tudo o que aconteceu
naquele ano, a orientação sempre foi a de nunca buscar revide, mas esperar que
o tempo se encarregaria de tudo esclarecer e, mesmo diante da dor e das
perseguições, nenhum gesto de vingança se registrou, vindo de seus parentes.
Decorridos mais de noventa anos de
tudo o que aconteceu em Recife, notadamente na Confeitaria Glória, quando João
Pessoa foi assassinado e depois, preso, João Dantas e seu cunhado Augusto
Caldas degolados na prisão e, três meses depois, com a morte de João Suassuna
no Rio de Janeiro, com certeiro tiro pelas costas, as famílias ainda carregam
certos estremecimentos. Se durante todo o tempo, a partir dos fatos de 1930 e
no decorrer dos anos, sobretudo quando dona Rita Suassuna estava viva, não se
buscava qualquer motivação para revide. E assim continua com as gerações que sucederam.
O escritor Ariano Suassuna, que tinha três anos quando o pai foi
assassinado, costumava dizer que passou a vida tentando compreender tudo o que
tinha acontecido e, escrevendo, tentava explicar os acontecimentos e, assim,
manter viva a memória de seu pai.
A resposta à dor e a impossibilidade de mudar a história, foi na
Arte que Ariano encontrou os caminhos para à resposta aos algozasses que
tiraram a vida de seu pai e de tantos outros.
*José Nunes é jornalista, escritor, diácono e membro da Academia Cabedelense de Artes e Letras Litorânea e do Instituto Histórico e Geográfico da Paraíba.
Transcrito de: https://jornaldaparaiba.com.br/politica/conversa-politica/2022/06/16/95-anos-ariano-suassuna-joao-pessoa-inspirou-obra-paraibano