Mulher de costas. By Keytokill. Copiado de http://keytokill.deviantart.com |
Elisa
Elisa nunca levou a sério nada que é sério. Nasceu e cresceu pra
flutuar na superfluidade do nada. Do que não cansa, do que não exige, do que
não faz pensar.
Se viveu eu não sei,
mas que cresceu, cresceu. Tá bem crescidinha. Cresceu em corpo e idade. Não
proporcionalmente, porque fisicamente ela cresceu melhor. Deve ter sido essa
tal lei da compensação.
Não sei porque as
vezes se compensa o nada. Mas com Elisa foi assim. Cresceu entendendo muito de
nada e de nádegas. E se o nada não a levou a nada, as nádegas a levaram a tudo.
Logo Elisa que na
escola só desfilava. Desfilava vaidades e mancadas. Foi ela que disse a
professora de Geografia que não falaria sobre a Chechênia porque a aula não era
de corpo humano. Também se negou a fazer uma prova oral porque só sabia o
assunto de escrever e não de dizer. Contam que foi ela que disse que Drummond
inventou o avião. Essa seria até aceitável pela semelhança fonética se Elisa
não já contasse idade de vestibular naquela época.
Não podia ser
diferente. O jornal chegava pesado de notícias e Elisa espalhava todas as
páginas em busca do horóscopo. Com anos neste ofício e ainda procurava o
horóscopo no caderno de economia. Na edição do domingo ia além. Lia também o
resumo das novelas. E tome festa e tome shopping; e roupas e saltos, e sol e
salão.
Não demorou e Elisa
virou madame. Casou com um rapaz que de tão ocupado com os negócios não teve
tempo de ver o nada de Elisa. Viu as nádegas. Paga por elas até hoje. E tome
shopping e roupas e saltos e joias e carros e viagens e tudo de novo o ano
todo.
E lá está Elisa sem
assunto nas rodas sociais. Tem colega madame que não trabalha, mas tem
profissão. É advogada, é publicitária, é arquiteta. Tem administradora que uma
vez por semana dá expediente na empresa do marido e se diz a peça mais
importante daquele negócio. Outra esbanja conhecimentos em artes plásticas e
música clássica. Fala em Picasso e Elisa solta um riso de vergonha. Fala em
Chopin e Elisa fica pensando o que é que isso tem a ver com cerveja. E ainda
aparece uma falando em inglês, francês e espanhol.
Mas Elisa é Elisa. Não
deixa por menos. Faz que entende, inventa, se passa por igual. Sempre dá um
jeitinho de parecer ser.
Que cara lisa a de
Elisa.
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