quarta-feira, 2 de maio de 2018

Conversa de pé de ouvido

maio 02, 2018 Por Alexandre Morais Sem comentários
Foto: Leca Acioly

    Hoje eu tive uma conversa de pé-de-urêa com Deus. Cochichamos um bom tempo e colocamos os pingos no is. Tenho cá minhas reticências em relação a seu jeito de ditar ordens nesse meu jeito de ser. Sou teimoso, malovido, desatento, e ao mesmo tempo obediente à sua divindade. Aprendi a espalhar o pelo sinal no rosto, fazendo um pedido em cada ponto tocado com o polegar. Antigamente, pedia um carrinho de brinquedo, uma bicicleta, um pião novo com ponteira e tudo, e às vezes uma roupa nova pra passar a festa de janeiro, a única que tínhamos na cidade naquela época, a Festa de São Sebastião. Isso acontecia em um cantinho sagrado, lá na casa de mãe. Havia um oratório, e dentro dele as imagens de Nossa Senhora, Jesus Crucificado e outro santo que não lembro qual era. Éramos treze pessoas, eu, meus dez irmãos, minha mãe e meu pai, mestre Heleno. Que saudades, meu velho!...
     Pois bem, todas as noites, à mesma hora, nos reuníamos, e tenho a impressão que mãe rezava aquele terço diário além da fé, também para contar os filhos, saber se estávamos todos lá ao redor de sua saia, pois pra contar todos, só ali, ou quando estávamos dormindo. Dona Maria de Lourdes, sempre atenta a tudo e a todos!
    Eu cresci, me tornei homem e ela ainda hoje acha que eu não sei rezar. E tem razão, nunca consegui decorar uma oração inteira, por isso aprendi a compor pra poder cantar minhas próprias ladainhas e fazer duetos com o Divino Espírito Santo.
    Obrigado, Senhor, por tudo que sou hoje, por tudo que tenho e pelo que não tenho, por meus amigos de fé e por aqueles que ainda virão.
    Boa tarde a todos e um bom São João para todos os artistas que, assim como eu, vivem da arte.
 
< Maciel Melo >

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