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Ontem estive deserto, hoje acordei multidão. Me olho no espelho, me espalho, me molho, me deixo chover. Me ganho, assanho a alma e vou ao banheiro cantar aquela música que ainda não fiz. A acústica é perfeita, me lembro dela e acelero o andamento rítmico da imaginação.
Ah! Meu velho banheiro! Qual músico nunca foi lá, testar a sonoridade de seu instrumento, ou se imaginar sendo Pavarotti, Plácido Domingos, João Gilberto, Luiz Gonzaga, Elis Regina, Edit Piaf ou Elvis Presley? Qual ator nunca esteve diante de um espelho de banheiro, sonhando ser o personagem que ainda não fez? Quem nunca cantou num banheiro, nunca acordou sonhando ser a bola de Pelé ou a tinta que Leonardo da Vinci escolheu para pintar a Mona Lisa. O primeiro estúdio, a primeira experiência sexual, o primeiro palco, o primeiro camarim, a primeira fossa, o primeiro vômito, a primeira ressaca, o primeiro tudo.
Ah! Meu saudoso e velho banheiro! Ficava horas e horas brincando com o eco, dialogando com os sonhos e digladiando com meus preconceitos, que não eram poucos. Ali era a minha caixa de fantasias onde eu guardava meus segredos, meus arrepios, meus medos, minhas trancas, meus enredos, passados cheios de muros. Meus pensamentos impuros, minha indecência medonha, rebelde, rude, risonha, zombando da inocência.
Foi no meu velho banheiro, que sonhei ser violeiro, cidadão e cantador. Lendo gibis capa e espada, playboy, palavra cruzada, velho western, bandoleiro, lá no meu velho banheiro, me tornei um sonhador.
(Maciel Melo)
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