Maciel Melo na Barragem de Brotas, em Afogados da Ingazeira, Sertão do Pajeú, Pernambuco. / Foto: Claudio Gomes |
De repente, tudo nublou. Uma nuvem em forma de rosto, enfurecida, se agiganta e começa a nevoar. O horizonte cinzento, o caminho deserto; nada vejo à minha frente. O espelho retrovisor reflete os coriscos que rasgam os céus distantes que deixei para trás. Estou à deriva, numa estrada estreita e triste, a mercê dos ventos que uivam tenebrosamente, assobiando uma melodia estranha, prenúncio de uma epopeia negra, prestes a ser encenada no palco das ilusões.
Não dá pra prosseguir, também não posso parar; regressar é impossível, pois o tempo se fecha, a chuva é de pingo grosso.
Acendo os faróis de neblina, mas o negrume do asfalto embaça-me a visão.
Paro, penso, oro e rogo a Deus um pouco de misericórdia. Viajar é preciso, viver é imprescindivelmente necessário nesse momento, pois tenho duas criaturas belas à minha espera, e prometi levar dois metros de chita pra fazer dois vestidos, e levá-las para passear nos verdes campos do azul do céu de minha terra.
Vou esperar desanuviar para seguir. O acostamento da estrada mal dá para estacionar uma bicicleta, pois uma banda do guidom ficaria na pista e a outra, no mato.
Olho à minha frente, alguma coisa esvoaçante me chama atenção. Chego mais perto, é um pedaço de pano verde-amarelo-azul-e-branco pendurado no galho de uma frondosa árvore, como uma biruta, indicando a direção dos ventos.
Hen-hem! Em outra dimensão, seria uma flâmula, encheria nosso peito de orgulho, e nos sentiríamos fortes e protegidos sob o seu manto sagrado, aquecendo-nos do frio e aninhando nossas esperanças no berço esplêndido de uma nação sã e salva, livre e inteligente.
Enquanto o tempo não estia, vou pernoitar por aqui, exilar-me em algum abraço onde exista para-raios e, quem sabe, o amanhã não amanheça tão nublado assim.
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