Foste tu, velha braúna
A divisão da paisagem
A gigantesca coluna
Da Natureza selvagem
Abrias tua ramagem
Pelas tardes nevoentas
As borrascas violentas
Nunca te causaram danos
Antes de trezentos anos
Te açoitaram mil tormentas
Respeitaram-te os machados
Das primeiras gerações
Teus grossos galhos crispados
Desafiaram tufões
Venceste mil furacões
Desde os tempos de Cabral
Atalaia colossal
Soberbo gigante antigo
Talvez até deste abrigo
Aos filhos de Portugal
Por certo ouviste as cantigas
Das tribos depois da guerra
Filha das lendas antigas,
Rebento santo da Terra
Antes, ó virgem da serra,
Dos danos daquele raio
Pelo teu leve desmaio
Colhias na fronde tua
Lindos sorrisos da Lua
Nos noites do mês de maio
Estes teus grandes madeiros
Há uns cem anos passados
Se sacudiam maneiros
Cheios de viço, copados
Nos teus ramos delicados
Nas horas do arrebol
O pequeno rouxinol
Cantava com mais ternura
Colhendo a doce frescura
Das brisas do pôr-do-sol
Já tens um lado comido
Da era que foi ingrata
Este teu galho pendido
Relembra longínqua data
Em teu pé uma cascata
Se despenhava fremente
Teu tronco, velho e doente
Pelo cupim estragado
Foi muitas vezes lavado
Pela fragosa corrente
Hoje, só tens a carcaça
Sobre a estrada caída
Uma pessoa que passa
Medita e sai comovida
Uma parte apodrecida
Onde outrora os sabiás
Voando dos laranjais
Vinham pousar cantando
E hoje passam voando
Se assustam, não pousam mais
Das plantas foi a mais bela
Que entre a flora viveu
Quem sabe na vida dela
Quantos janeiros venceu ...
Depois murchou e morreu
Ficou dos ramos despida
Para o poente estendida
Sem verdura e sem beleza
Talvez que nessa tristeza
Sinta saudades da vida.
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