Com o AI-5 em pleno vigor, uma ideia foi colocada em prática como forma de protesto
Junto com a
ditadura, as ferramentas de cerceamento a informação e ao entretenimento foram
instaladas em âmbito de prioridade pelos militares na década de 1960.
O Ato Institucional nº 5, popularmente conhecido como AI-5, permitiu que
existisse uma agência estatal responsável por monitorar,
"regularizar" e suspender a veiculação de qualquer tipo de material
audiovisual em veículos de comunicação. Para se ter ideia, nem mesmo Adoniran
Barbosa, com a icônica "Tiro ao Álvaro", foi poupado pelos militares.
A
interferência era feita desde a publicidade e filmes, até programas de
televisão e música. O último, em específico, contou com diversas estripulias de
artistas para driblar a proibição de conteúdo considerado inadequado — desde o
“cale-se” à ditadura na canção “Cálice” de Chico Buarque, até em trocadilhos menos
politizados, como em “Feira da Fruta”, de Odair Cabeça de Poeta.
No surgimento do rock nacional para as grandes massas, uma banda foi
responsável por dar uma abertura comercial e fonográfica ainda maior para
outras bandas do gênero, falando de temas cotidianos durante o período final do
AI-5. Contudo, teve de arcar com a censura do DCDP - Divisão de Censura de
Diversões Públicas, como informou a Rolling Stone Brasil.
Parados
na blitz
A banda Blitz lançava seu disco de estreia, 'As Aventuras da Blitz',
contendo o sucesso "Você Não Soube Me Amar" e outras faixas que
ocuparam as frequências de rádios musicais nos anos de 1982 e 1983, além de
fazer parte de trilhas sonoras em novelas e inovar em clipes transmitidos no
Fantástico, da TV Globo.
No entanto, o sucesso inicial e confiança da gravadora precipitou a
prensagem dos vinis contendo as faixas da banda, resultando em um problema para
a comercialização.
A censura considerou as duas últimas faixas do álbum — “Cruel Cruel
Esquizofrenético Blues” e “Ela Quer Morar Comigo na La” — impróprias por conter
o termo "bundando", um palavrão e trocadilhos com a palavra
"peru".
A proibição da execução caiu como um balde de água fria ao conjunto, como
revelou o vocalista Evandro
Mesquita no programa Discoteca MTV, na extinta emissora
paulista: "A gente sofreu uma porrada da ditadura e a censura na época era
muito braba. [...] Mas aí, a gente teve a ideia de rabiscar a matriz do disco
para passar aos nossos ouvintes a agressão que a gente sofreu".
Barato
e bom
As tiragens seguintes poderiam ter cortado a faixa na prensagem, mas os
primeiros lotes continham a canção. Dessa maneira, os seis membros se reuniram
e, por horas, tinham como alvo 30 mil cópias, arranhando manualmente as duas
faixas do LP — no mecanismo de vinil, é possível identificar as linhas de cada
música por tratar-se de uma leitura analógica.
Ainda no Discoteca MTV, a vocalista Márcia Bulcão explicou que o
rabisco tinha não apenas a intenção de ser inaudível na agulha de um
toca-discos, mas ser visualmente vandalizado: “A gente já foi riscar para todo
mundo ver que existiam duas músicas e elas foram censuradas. Foi uma coisa bem
de protesto mesmo!”, explicou.
Mesmo assim, a censura não foi párea para interromper o sucesso comercial
do álbum, que de acordo com o portal de cultura do jornal O Globo, teve mais de um milhão de
cópias vendidas.
As duas músicas ainda puderam ser ouvidas anos depois, quando a banda
lançou uma reedição em formato de CD, já após a redemocratização do país.
Fonte: https://aventurasnahistoria.uol.com.br/noticias/reportagem/30-mil-discos-arranhados-mao-como-banda-blitz-conseguiu-lidar-com-censura-da-ditadura.phtml
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