sábado, 8 de maio de 2021

Contos do Cangaço

maio 08, 2021 Por Alexandre Morais Sem comentários

Bigode de Arame – Tio, influenciador e chefe de Virgulino

Por João Costa

   Na escola do cangaço em que Virgulino Ferreira aprendeu e se tornou o mais famoso cangaceiro de todos os tempos, Antônio Matilde, o Bigode de Arame, foi seu professor e tio, porque tornou-se bandoleiro e soube a hora de parar, desaparecer nas caatingas para morrer sossegado e incógnito no interior da Paraíba.
  Nos documentos oficiais Bigode de Arame aparece com dois nomes: Antônio José Ferreira e Antônio Ferreira dos Santos, filho bastardo de Antônio Ferreira Lima, avô de Virgulino Ferreira, Lampião, nascido na região do Poço do Negro, Floresta (PE), que se tornou agente da lei na condição de subdelegado e depois chefe de bando de cangaceiros.

Bando de Lampião em 1922 - a chamada Velha Guarda do cangaço Lampiônico

  Foi para região do Poço do Negro que José Ferreira se mudou com a família, na tentativa inútil de afastar os filhos Virgulino, Antônio e Livino dos conflitos familiares com a família Nogueira e com Zé Saturnino, em Vila Bela.
  Antônio Matilde era considerado pelos irmãos Ferreira como o “tio bonachão”, aquele que aparecia de tempos em tempos levando presentes para todos, num paparico que o tornou admirado pelos “sobrinhos”, influenciador e depois chefe.
   O homem também era tio de um certo Luiz Marinho, casado com Virtuosa, irmã de Lampião.
  Isso pelo lado da família Ferreira, porque por outro, também era parente simplesmente de um tal João Dedé, cangaceiro Criança, e José Dedé, que tinha como alcunha Baliza.
 Como subdelegado, foi acusado de corrupção por conluio com ladrões de gado e tirar proveito de furtos, além de proteger cangaceiros parentes seus.
  Isso lá no finalzinho do século XIX, porque no início do século XX Antônio Matilde já se tornara cangaceiro do bando de Cassimiro Honório, que para variar, também era seu parente.
  Relatam que foi ele quem mais influenciou e incentivou Virgulino e seus irmãos a se tornarem cangaceiros, fornecendo armas e proteção aos irmãos quando estes iniciaram “na vera” a guerra contra os Nogueira, Zé Saturnino e as famílias de Nazaré do Pico, distrito de Floresta.
  Antônio Matilde recorrentemente mobilizava seus homens para colocá-los a serviço de Sinhô Pereira, logo em seguida, ele mesmo passou a chefiar um pequeno bando de cangaceiros que sob seu comando, constavam simplesmente os “sobrinhos” Virgulino, Antônio e Livino Ferreira.
  Perdeu o “posto” de chefe de bando em 1920 para Virgulino, e passou a atuar sob a liderança do sobrinho na jornada de vingança sem fim contra os Nogueira e Zé Saturnino, nos ataques às suas propriedades, matando gado, incendiando e destruindo bem-feitorias.
  Em 1921 as coisas começam a mudar para Antônio Matilde.
  É alvejado de leve num tiroteio com a polícia alagoana, sob o comando do tenente José Lucena (o mesmo que matou José Ferreira, pai de Lampião), que àquela altura, no comando de 120 soldados, botava pressão ao banditismo rural.
  Após muitos assaltos e saques, incluindo o rentável assalto à baronesa de Água Branca, Matilde convoca uma reunião do bando na região do Moxotó pernambucano para comunicar aos “sobrinhos” sua decisão de abandonar o cangaço.
  E ainda fez uma recomendação: que os irmãos Ferreira fizessem o mesmo.
   - “Se espalhem e finjam de mortos até a poeira baixar, ou arribem, como eu vou fazer”, disse Matilde a Lampião.
  - Meu tio, o plano está bom para o senhor e os outros. Eu, que já estou vivendo debaixo do chapéu, não quero conselho nem dou. Este rifle, só deixo se eu morrer. E o estado de Alagoas, a Deus querer, eu queimo!”, teria respondido Lampião, segundo relato do cangaceiro Medalha, ao escritor Frederico Pernambucano de Mello.
  Terminada a tal reunião, Antônio Matilde reuniu a família, botou tudo que tinha em lombos de burros, muito dinheiro nos bornais, mudou o nome para Antônio Ambrósio; cruzou o Pajeú e a divisa de Pernambuco, ingressou com a família na região de Monteiro e terminou sua jornada em Catolé do Rocha, Paraíba, em redutos dos Rosado Maia, mergulhado no anonimato, onde viveu incógnito, até morrer.

Fontes: Cangaceiros de Lampião de A a Z, de Bismarck Martins de Oliveira.
Apagando o Lampião, de Frederico Pernambucano de Mello.

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