Os Olhos
São rasos os olhos de quem chora, e profundos os de quem está amando, razão porque as escabrosidades do espírito transbordam pelos arroios dos olhos, pórticos das emoções interiores.
São fleumáticos os olhos de quem têm esperança, mas sobre eles poderá descer a cortina da frustração se se esvaziar o peito, então a aluvião do desespero soterrará a crença.
Ao contemplar um filho, os olhos dos pais têm a argúcia perfeita, capaz de iluminar o rosto por inteiro, na tradução específica do que é ternura e felicidade. Cobrem-se de aflição os olhos de quem sente saudade. Há quem admita que eles estão vazados, quase não conseguem enxergar coisa alguma, porque se eram rasos ontem, não deixaram de sê-lo agora, e se encontram subjugados pelo afogo causado pelo véu negro da insatisfação e da dor.
Abrem-se os olhos para o amor, qualquer que seja a forma que ele se manifeste, mas se fecham no luto da ingratidão. O amor é arrogante, e por admitir sua autossuficiência, é suicida, pouca satisfação dá às circunstâncias, ao passo que as circunstâncias têm o condão de aumentá-lo ou diminui-lo, levá-lo às alturas ou abandoná-lo na sarjeta, sendo legado aos olhos a expressão final do destino.
Têm ternura os olhos de quem faz caridade e punhais os daquele que foi traído. Só as boas ações podem acender as luminárias da alma; a perfídia impulsiona sentimentos negativos, traz o amor enfermo e pode levá-lo a óbito nos leitos abandonados dos corredores vazios do coração.
Quem odeia traz nos olhos a ignorância comum aos animais e só consegue enxergar o amarelo e o vermelho, justamente por lhe faltar inteligência para lidar com o verde e o azul esparramados nas sendas da esperança infinita.
Se está orando, há nos olhos o vilipêndio à arrogância; se estiver pedindo, agasalha a contumácia pelo merecimento; mas se estiver perdoando, sentirá o beneplácito do amor supremo. Em todas essas situações os olhos têm a limpidez dos lagos cristalinos.
E se lhe perguntarem qual a verdadeira cor dos olhos das pessoas que lhes são caras, preste atenção na maneira como elas julgam seus pares, porque a cor lhes é dada pela alma e tem por resultado a policromia interior.
Mas se lhe indagarem como proceder para sempre ter brilho nos olhos, responda que o caminho mais rápido e eficaz é direcionar as ações para o interior da alma, bem para dentro, onde reside a força propulsora da alma, da criação humana, do amor maior, e os olhos sempre terão o brilho indispensável e capaz de iluminar as estradas por onde se há de passar até ser alcançada a última curva do caminho.
Publicado originalmente no Blog do Finfa
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