João Grilo e Chicó no Brasil das mentiras oficiais
Ariano Suassuna
completou 94 anos nesta semana (quarta-feira, dia 16) e essa data não pode
passar batida. Seu pensamento segue vivo e prefiro ignorar a morte física que
se deu 2014 e tratar o aniversário como missa de corpo presente. O escritor
paraibano talvez seja a figura mais associada à ideia de ser nordestino ou
nordestina no Brasil de 2021. Isso não é nada pouco, acompanhe a toada.
O certo é que
diante de qualquer ideia de nordestinidade, alguém salta de imediato com uma
frase do dramaturgo: “Eu não troco meu oxente pelo ok de ninguém.” Seja o papo
sobre um Nordeste real ou inventado, é ao embornal do autor de “A pedra do
reino” que muita gente procura em busca de mantimentos.
Quando o romancista
não resolve, seus personagens dão um jeito. É só recorrer a João Grilo e Chicó,
criaturas tiradas dos folhetos de cordel que renderam a Suassuna sua obra mais
popular, “O Auto da Compadecida” (1955). A mesma peça, em versão do diretor
Guel Arraes (1998), deu no filme estrelado por Matheus e Selton Melo.
Nas sessões da CPI da Pandemia, por exemplo, os
depoentes negacionistas parecem repetir a todo momento o Chicó: “Não sei, só
sei que foi assim”.
Não repetem, porém,
com a mesma graça e ingenuidade da ficção. Em vez do nosso riso, morte e
prejuízo.
Benditas mentiras e
proezas de João Grilo. Revelam um humor sertanejo de resistência às
contrariedades da rotina e às bagaceiras do país. Bem diferente das lorotas
milicianas do “Brasil Oficial”. Nem se compara. Desculpa aí, respeitável
criatura grilesca.
Parabéns pelos 94,
Suassuna, e desculpa pelo aluno relapso que fui durante as aulas no Centro de
Artes e Comunicação (Cac) da Universidade Federal de Pernambuco (UFPE), em
1982. Valeu cada minuto dos bons encontros. A minha turma, óbvio, implicava com
algumas convicções estéticas do mestre, que havia protestado contra o uso das
guitarras elétricas no Tropicalismo.
A polêmica musical
retornaria nos anos 1990, com o surgimento do Mangue Beat, representado pelas
bandas Mundo Livre S/A e Chico Science & Nação Zumbi. Tudo não passava de
um belo e saudável debate de ideias.
Eu não troco meu oxente, pelo “tá ok” do cercadinho dos horrores presidenciais. Desculpa aí, caríssimo Suassuna, pela leve adaptação do tema.
0 comments:
Postar um comentário