segunda-feira, 27 de dezembro de 2021

Versos de Saudade - Alexandre Morais

dezembro 27, 2021 Por Alexandre Morais Sem comentários

Saudades
Versos de Alexandre Morais
Artes de Marcos Pê

Muitas mulheres me amaram
E eu também as amei
Mas por razões que eu não sei
Todas me abandonaram
Umas até retornaram
Mas por virem sem vontade
Foram com facilidade
E por esse vai e vem
Fiz do peito um armazém
Pra empaiolar saudade


Algumas, algumas vezes
Voltaram mais de uma vez
Com muitas fiquei um mês
E com poucas fiquei meses
Mas meus costumes burgueses
Eram pobres na verdade
E o banco da mocidade
Empresta, mas faz cobrança
Fiz do peito uma poupança
Pra depositar saudade


De apaixonado eu fiz fama
Mas no amor só sofri
E saudades já senti
Três vezes da mesma dama
Se ia, ficava o drama
Ao voltar, com falsidade
Trazia só a metade
Da que veio no começo
Fiz do peito o endereço
Da morada da saudade


A saudade é troço ruim
Pesado de carregar
Poucos podem suportar
E muitos pedem o fim
Quem veio por onde eu vim
Sofreu seca e tempestade
E sabe que a liberdade
Não é mar é uma ilha
Fiz do peito uma rodilha
Para o pote da saudade
 
Nessa vida o que se planta
Nem sempre é o que se colhe
Por mais que se adube e molhe
Tem talo que não levanta
Como eu, quem se encanta
Com beleza e quantidade
Esquece da qualidade
E foi não foi quebra a cara
Fiz do peito uma coivara
Com garranchos de saudade


Quando só na noite fria
Ainda escuto o barulho
Que o silêncio do orgulho
Grita na mente vazia
Comprei tudo que eu queria
Mas vendi a lealdade
Comparado à mocidade
Quem foi moto hoje é lambreta
Fiz do peito caderneta
Pro fiado da saudade

Como autêntico boêmio
Em bares eu fiz pernoite
E enquanto existisse noite
Uma taça era o meu prêmio
Agora sofro abstêmio
No balcão da crueldade
E o prêmio é uma grade
Que o coração rodeia
Fiz do peito uma cadeia
Para aprisionar saudade

Na igreja eu pouco fui
Nunca pisei num altar
Porque pensava: casar
Em nada nos evolui
Mas a casa quando rui
É outra a realidade
E solidão quando invade
A roda roda ao contrário
E eu fiz do peito um rosário
Só com contas de saudade

 

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