ANTÔNIO
AÇUDINHO, O CEGO CANTADOR
Alexsandro Acioly
(Pesquisador e Historiador - CPDOC/PAJEÚ)
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Imagem Ilustrativa - (Internet)
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Que Carnaíba é a
terra do saudoso Zé Dantas, parceiro do eterno rei do baião, Luiz Gonzaga, acho
que o Brasil e o mundo inteiro sabem disso. Que Carnaíba é considerada a terra
da música, mesmo havendo algumas ressalvas, milhares de pessoas sabem. Que
Carnaíba tem uma Orquestra Filarmônica Centenária, da qual emanaram músicos
maravilhosos, e que ainda hoje, continuam a permear o Sertão do Pajeú com novos
talentos, poucos sabem.
Agora, que um dos
grandes cantadores que existiu lá pelo final do século XIX na região do Pajeú,
era fruto deste celeiro musical, creio que pouquíssimas pessoas saibam.
Estou falando de
“Antônio Açudinho”, natural do Pajeú das Flores, mais precisamente da Villa de Carnaíba,
ou até mesmo da Fazenda Carnahyba, sendo ainda desconhecida a data do seu
nascimento e de sua morte.
Lendo a belíssima
obra (trilogia) do moxotoense, Ulysses Lins de Albuquerque, tive o prazer de
conhecer um pouco da história desse pajeuzeiro que, segundo o autor, foi um dos
maiores cantadores que ele já viu cantar, sendo os seus versos e improvisos perfeitamente
admiráveis.
Açudinho, além de
analfabeto também era cego, cegueira esta causada pela picada de uma cobra
Jararaca. Ulysses Lins frisa muito bem em um dos seus livros a inteligência e a
memória gigante que tinha o velho cantador.
No livro, Moxotó
Brabo, o segundo dessa trilogia, Ulysses descreve uma das maiores pelejas de
Açudinho, fato ocorrido na povoação de Custódia por volta do ano de 1900 entre
ele e outro cantador vindo de Caruaru, no agreste pernambucano. Esta cantoria
teve a presença do Padre Frutuoso Rolim, da paroquia de Pesqueira, mas que
havia ido celebrar a missa em comemoração ao padroeiro da cidade, São José.
Segue abaixo, quatro sextilhas
desse desafio entre Açudinho e Ferreirinha:
A – Meu colega
Ferreirinha,
Seja bem-vindo a esta terra,
Mas me diga se é de paz,
Ou se tem intenções de guerra,
Pois eu preciso avisar
Os meus caboclos da serra.
F – Muito obrigado,
Açudinho,
E consista que o saúde.
Mas você fala com um homem
Que a ninguém no mundo ilude;
Eu venho aqui de bem longe,
Só conhecer seu açude.
A – Pois assim
somo amigos,
E eu lhe trato com carinho,
E agora estou satisfeito
Porque não canto sozinho;
Porém quanto ao meu açude,
Não passa de um açudinho.
F – Açudinho isto é modéstia,
Pois não se pode negar
Que ele na boca do povo
Parece um braço de mar;
Mas com toda essa grandeza,
Nele eu quero mergulhar.
Claro que a peleja
não ficou só nisso, provavelmente estendera-se durante toda a noite.
Açudinho talvez tenha
sido um desses menestréis, que foram esquecidos pelos seus contemporâneos, pois
pouco se fala nesse velho repentista e cantador de histórias. No livro, Um Certo
Jó, de autoria de Alberto da Cunha Melo, este cita uma lista de cantadores onde
aparece o nome de Açudinho, mas infelizmente, não há a data de nascimento,
morte ou até mesmo a sua naturalidade. O certo é que ele existiu e foi apagado
da lembrança de alguns pajeuzeiros e moxotoenses do nosso sertão pernambucano,
pois raros são os relatos à respeito desse cantador que encantou o Pajeú e o
Moxotó com suas belas pelejas.
Fontes:
- Albuquerque, Ulysses Lins de, 1889-1979
Um sertanejo e o Sertão/Ulysses Lins de Albuquerque. - 4. ed.
- Albuquerque, Ulysses Lins de, 1889-1979
Moxotó Brabo/Ulysses Lins de Albuquerque. - 3. ed.
- Albuquerque, Ulysses Lins de, 1889-1979
Três Ribeiras/Ulysses Lins de Albuquerque. - 3. ed.